quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Sorrisos, orgasmos e lágrimas.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

"E deslizo para esta solidão demasiado humana de não poder voltar a ser sozinho, como era quando tu existias, nesta mesma cidade, e eu já nem sequer pensava em ti."

Inês Pedrosa

Porque já agora tudo que espero vem de você, afinal. Sabe aquela velha imagem que fiz de ti? Não errei em nenhuma pincelada. Ou, na verdade, talvez seja ao contrário - a responsabilidade de tanto acerto é sua apenas. Tenho culpa por ter encontrado você? Se era justamente quem eu procurava! Agora fico lembrando de como você acordava pela manhã - com a cara amassada e apregoada por uma marca de travesseiro. Bom dia com alegria, é uma delícia acordar do seu lado toda manhã, minha querida. Como me divertia com as brincadeiras criadas no afã do romance! As frases que criamos juntos e decorávamos para dizer a cada deixa. As cócegas e jogos bobos - olhar nos olhos e ficar sério!

"O que está olhando? Pára de olhar para mim, não gosto!" Faço cara de bobo, e digo coisas tolas nessa brincadeira gostosa de amar. Fico te observando, me perco em seus olhos. Consegui ver tantas coisas! Como na última vez que procurei algo ali: nem te conto o que encontrei! Mas então tudo se foi, e fiquei apenas com o gostinho do que diziam seus olhos. Maldito gosto agridoce difícil de esquecer. Também que não estou tentando, em absoluto. E nem te conto o que encontrei!

Faço cara de bobo e fico perdido te observando. "O que foi? Pára de me olhar". Sabe o que é? Lembra daqueles filmes romântico-clichês em que quando o garoto vê a menina que vai amar pelo resto da sua vida fílmica o tempo pára? Pois! Fico te observando e o tempo pára. Mas nunca ninguém explicou que o tempo não pára para todos, então, entro em stand by curtindo meu tempo parado e o que você vê é uma "cara stand by", porque estou perdido numa profusão de sentimentos dos quais você faz parte, mas que estão guardados bem seguros aqui dentro - me perco por ali, e meu corpo fica distraído. Deve ser uma careta digna de Calvin & Haroldo, no mínimo. Pronto, falei o segredo da cara de bobo! Careta stand by enquanto eu morro e renasço, crio e desapareço dentro de mim e perdido em seus olhos.

Diabos! Como é difícil escrever essas coisas. Saudade imensa de tudo que foi e de todas as possibilidades futuras.

Tentar esquecer dói, porque é lembrar que se tem que esquecer. Dói porque tentar esquecer faz lembrar, e também lembra o porque de se querer esquecer. Mas quem colocou essa palavra aí no meio? Foi você? Porque eu não fui: jamais esquecer. E quanto a parar de pensar em você então! Besteira absurda! Antes teria que mudar minha vida, meu quarto, meus móveis - eu mesmo e comigo tudo que acredito e também aquilo que amo. Seu cheiro está por aqui, seu gosto, seu calor, a marca de seu corpo na cama onde deitou comigo. Intragável tentar ignorar isso. Não quero. Ainda guardo um pouco do perfume que você gosta, para usar para você.

"Sempre vivi em teoria, assustada com os buracos negros entre fulgurações - muito mais do que tu. Assim nos encontramos agora - eu, filha de um Deus desleixado, tu, fervoroso praticante das distâncias impensáveis. Não sei pensar sem ti. Deslizo pelas esponjosas paredes da morte e capto a revelação da tua orfandade - não sabes amar sem mim.

Nós éramos um do outro. Coincidimos e rejeitamos a coincidência, com a petulância típica dos pobres, confinados à prisão do seu sofrimento. Nós éramos um do outro e não descobrimos, preferimos respeitar os protocolos da nossa era, dar prioridade à voz obrigatória do corpo. Nós éramos um do outro de outra maneira - de uma maneira escura, espessa, transcendente. O que podíamos nós, escravos da Inteligência Suprema, escutar de transcendente? Como podíamos nós, ilustres servos da História, alcançar a luz trêmula do pequeno milagre que nos era dado?"

Inês Pedrosa

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O Urso de pelúcia e a Bailarina da caixinha de músicas

Acordei assustado - nem durmo direito e acordo assim ainda por cima! Olho ao lado e encontro sua caixinha aberta, minha Bailarina. Acordei pelo som ou pela vontade mesma de ver a ti? Será meu desejo tão intenso que o simples estalo da pequena e frágil tranca se abrindo possa me acordar? Quase certeza que sim.

Porque sei que esperava ansioso você aparecer para mim novamente. Afinal, não consigo esquecer de você, meu bem. Depois de te ver dançando ao som daquele piano muito bem arranjado, com seus passos deliciosos. Malditos passos treinados, agora estou viciado nessa música e em você.

Que tesouros podem estar guardados na caixinha além de você mesma? Não sei. Eu só vejo a ti e não acho que possa existir algo mais. Gosto de imaginar que dança só para mim também. E invente esses passos maravilhosos só para mim! Me olhe entre uma pirueta e outra, me deseje enquanto te desejo também. Que loucura foi aquele dia em que pensei que me olhava! Uma olhada meio distraída de minha parte e, de repente, parecia que você estava me observando - e me enxergava. Era assim? Você me viu naquele dia? Diga que sim, diga que sim!

Continuo te olhando, procurando essas coisas. Não me faço de rogado, estou aqui te observando. Meu alento é te ver dançando e só. Esperando que olhe para mim em troca. Quero passos de uma dança apaixonada para mim e para dançarmos juntos.

Você parece tão triste às vezes. Ensinada a dançar toda vez que a caixa se abre, nada mais. Passos desenganados, afinal, são todos iguais. São todos iguais? Perceba, minha Bailarina, que vejo tudo diferente, tudo muito e possível em suas mãos. Eu me postaria sem reclamar bem aí do seu lado e te mostraria isso, mas não sei se é o que você quer. Digo que nada é o mesmo, Bailarina, a partir do momento que você dance por alguma coisa. Dance por mim.

Talvez seja eu. O brinquedo quebrado e velho no canto do quarto pode ser seu verdadeiro espectador! Olhe para mim aqui, debaixo da cama. Espere! Deixa eu pegar ali meu braço que caiu. Agora sim, olhe para mim. O que achou? Dance para mim porque acredito que só eu enxergo o que você é, não vejo sua dança apenas, sabia? Procuro a plenitude desse amor em cada passo teu, e você mesma em cada um deles, mas não faço de sua dança tudo o que você é. Eu só estou distante porque não deixa que me aproxime - porque não sei se quer que eu chegue perto.

Luto contra o pó que cobre meus olhos para conseguir te ver sair de sua caixinha. Eu quero te ver. Eu quero te ver! Pelo amor de Gepeto, Bailarina. Eu quero te ver! Como posso te esquecer se cada vez que sai de sua caixinha você parece ainda mais linda? Será que você espera ansiosa para me ver? Diga que sim e eu me arranco da minha condição mesma de brinquedo estropiado, guardado numa infância desgastada - debaixo da cama - e vou até aí te buscar! Mas eu nem sei dançar... Eu nem sei dançar e desejo a linda Bailarina da caixinha de músicas.

Você deve estar apaixonada por algum dos soldadinhos de chumbo, imagino. O que te faria olhar para um ursinho de pelúcia maltrapilho? E tem todo esse maldito pó que guardam debaixo da cama junto comigo. Malditos soldadinhos de chumbo!

Ainda assim, sonho em algum dia ser seu par ideal numa dança eterna quando a caixinha se abre, embalados por notas brandas dançando de corpo colado, e depois nos guardamos novamente. Todos os outros te vêem dançar, Bailarina. É suficiente para eles. Mas eu quero estar com você quando estiver dentro de sua caixa, não quero apenas a dança perfeita, mas também a claustrofobia
da caixa - do seu lado.

Não consegui prender novamente meu braço esquerdo que caiu mais uma vez. Um de meus olhos está preso por um fio apenas, logo cai. Minha orelha direita se perdeu numa brincadeira - no tempo em que eu ainda era brinquedo novo. Tenho pó e sujeira por todo meu corpo de pelúcia. Não consigo sequer derramar uma lágrima, por você e para me limpar. Porque sou todo brinquedo. Guardei, contudo, esse coração no meu peito que diz "eu te amo", costurado de forma tosca aqui, para te entregar um dia, Bailarina. Olhando bem, esse coração é tão mal feito que acho que sou brinquedo dos mais baratos. Olhando bem, acho que vou ter vergonha de entregar uma coisa tão feia para uma bailarina de cristal que dança ouvindo notas tão delicadas de piano. Talvez a parte debaixo da cama seja meu lugar, e aqui eu dava guardar essas coisas

Mas o pó continua incomodando.

Continue dançando, por favor, mesmo que não seja por mim, porque vou continuar imaginando que você me enxerga - mesmo que talvez não me veja.

Bailarina, eu amo você.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

São essas metafísicas pessoais que destroem o próprio ser, afinal.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Deitado, fico olhando pela janela. Vejo um céu de nuvens cor de chumbo se formar, o vento ligeiro traz cada uma delas que forma todo um teto cinzento de perniciosas nuvens que prenunciam a chuva – fico pensando numa dança de passos rápidos debaixo dela. Ou passos lentos, de corpo junto e inteiro, olho-no-olho-mas-não-pise-no-meu-pé, sabe? Mas o que me resta é ficar observando as nuvens. Olho pela janela que outrora você soprou e nas marcas do seu hálito escreveu nossos nomes, e desenhou aqueles desenhos que só faziam sentido depois que você explicava – mas que depois de explicados tudo era muito óbvio! As coisas que só você enxergava... Fico olhando pela janela dos seus desenhos, enquanto se formam as nuvens que vão cuspir a chuva que vai apagá-los da minha janela, e as pegadas que deixamos por algum lugar qualquer. A chuva vem para limpar as marcas que deixamos por aí. Você pode estar andando pelas ruas bem agora, e essa água toda pode estar me tirando de suas roupas e de seu corpo - bem agora. Agora que já não sei mais por onde anda. Não é mais nossa dançante chuva que entoa uma canção na nossa janela. Passou a ser muito mais a sua chuva, e o modo como você a vê, e a minha própria chuva e como tento encontrar você por entre os respingos daqui e dali. Fenômenos distintos arraigados em meu próprio vinho tinto que embala esse prenúncio de tempestade. Procuro as mesmas notas de outrora nas batidas da chuva em minha janela, as notas que ouvimos juntos – mas que só existiram enquanto dividíamos o mesmo corpo, quando fomos um só que pareciam dois. Nesse momento, prevejo a tragédia do final inacabado – que acabou antes do que deveria – e como um conforto para minhas próprias esperanças fecho a janela dos seus desenhos para que não se molhe o que existe do lado de dentro, ou seja, os seus desenhos, que sempre achei engraçados, principalmente quando me explicava o que eram, sempre muito mais complexos e cheios de detalhes do que pareciam. Protejo você dentro de mim , da chuva. Aqui ela não te toca, porque aqui estou eu com o que restou de você – se chover aqui, apagam sua obra, mas também eu me apago com ela. Não te toca porque não deixo esmorecer essa bagunça de sentimentos galantes e atávicos da imagem que eu fazia do que sempre esperei. Não sou eu mesmo, deverás, um seu desenho mal feito? Pois bem! Sou o bonequinho palito cheio de personalidade que você desenhou, mas é só você quem enxerga tantas coisas em linhas tão pobres quanto as minhas. Para todas as outras pessoas sou apenas um bonequinho palito, com uma cabeça desproporcional ao resto do corpo. Meu desalento é ficar imaginando quantos outros bonequinhos palito você ainda pode imaginar. Eu mesmo não tenho nada diferente, apenas outro boneco simplório fácil de desenhar. Meu desalento, portanto, é minha condição mesma de rabisco. Por que você não me desenhou com um chapéu bobo? Sou igual a todos os outros.

Acho que já está na hora de eu começar a usar as palavras brandas em meus textos. Sabe como é? Tornar tudo pequeno, palatável, ao alcance da mão – não porque as coisas estejam de fato tão próximas, mais por não ser plausível acreditar na imensidão de uma expressão que se torna irreal a cada passo (demasiado largo, diga-se). Traços esfumaçados e imprecisos não podem ser objeto de adoração e esperança – ou podem? Não enxergo longe, de qualquer forma, para mim são ainda menos que isso. Espere! Tampouco estarei imaginando uma vida de mediocridade para mim mesmo, mas, apenas por não ficar imaginando a todo o tempo a enorme possibilidade de pores-do-sol e ventos folheados, assim, a decepção que seria um baita trago amargo quando chegasse e se confrontasse com a grandiosidade de alguns sonhos, se torna menor – todas as coisas se amiúdam, aliás. A importância de tudo isso também se amiúda, meu bem. Isso sob a subversão da realidade que subverteu meu ambicionado estilo lingüístico – nada mais. Pois! Nem me atrevi a levar isso para além do papel riscado – na verdade, não se atreveu a sair dali, apesar de minhas vontades. O que existe mais para se dizer? Nada. Todavia, continuo escrevendo, mas de forma mais abrandada agora.


Agora que você saiu do jogo e tudo parece monótono e sem cores. Lembra-se do Coronel Mostarda e da Dona Branca? Eu adorava jogar esse jogo: Detetive. Alguém era azul, alguém negro e uma vermelha – a femme fatale, obviamente. Pois bem, não vejo mais cor alguma. Olho pela janela e o céu é cor de chumbo com nuvens opacas. Quem se importa? Já começo a adormecer de qualquer forma, me incomodo um pouco com tamanha falta de criatividade – falta de beleza, pois sem você não há beleza? – mas já começo a cair no sono. Logo não me incomodará mais, porque adormeço. Também, começarei a me habituar a essa falta de cores e dormirei com mais facilidade, a cada dia que passa. A cada dia que passa sou eu também menos cores, menos criatividade. E os dias passam, passam... E você por acaso percebe? Será que te angustia também essa infinidade de dias que vem e vão sem deixar mais nada de nós, além de fazer o favor de levar consigo o pouco que restou? Lá se vai uma memória gostosa e outra daqui - as coisas perdem todo aquele brilho, afinal. Imagens vazias e tristes. Mas que insistem em existir! Só por elas é que os dias passam tão sofríveis.


Seria melhor talvez que você nunca tivesse existido em minha vida? Para não te ver desmanchar-se em mim? Ou talvez fosse melhor que nunca houvesse um fim, para que a perfeição disso se repetisse eternamente, em novas formas de dizer venha ver como a lua sorri de escárnio dessas tristes almas pela rua, enquanto nos misturamos na cama em sorrisos acrobatas e inovadores - não que eu seja insensível com a dor alheia, apenas teria orgulho de um amor maior. Mas existe um consenso, já que não pode ser saudável ficar contemplando esse final trágico se concretizando - você partindo ao longe e sem mim. A pior parte é sofrer por possibilidades futuras e almejadas. O que poderia ser disso tudo? Ah! Como sonho com esse sonho! Talvez esse sonho mais do que concreto algum dia seja tudo que eu precise pra ser feliz. Mais do que isso, tudo aqui escrito só veio para dizer: sinto sua falta. O que houve com as palavras simples? Não faço a menor idéia. Mas toda essa confusão semântica se resume a uma coisa que é você que não está aqui. Resta saber quem está errado: a esperança na grandiosidade das palavras dessa vez vividas na vida, ou a certeza do nada que sempre nos espera. O nada é sempre mais fácil.

segunda-feira, 16 de novembro de 2009

"Eu sempre digo que ser feliz é fácil. Quero ver é ser infeliz e abrir mão dos malditos orgasmos, do chocolate importado. Aí é que precisa ter talento, bom humor negro e pessimismo... e não gozar jamais."

Marcelo Mirisola, O Azul do Filho Morto.

quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Hai Kai Azul

Blue
C'est la vie
Deja vu
Bemtevi

Roberto Xavier
"Ah, meu Deus, tudo o que eu quero - já disse, e repito - é um ventre branquelo e gordinho para descansar. Sexo é bom, o problema é que custa caro e tem o depois. Uma infância claustrofóbica. Adolescência, idem. A primeira vez igualzinha semana passada. Uma vida sentimental miserável, falta de dinheiro e felicidade pro consumo alheio, depois das dez sinto sono. Eu gostaria de decepcionar aqueles que acreditaram em mim. Ir embora. Além disso, eu sonho com um grande amor em Buenos Aires, nos arredores da Telcahuano con Bartolomé Mitre. Um inverno melancólico (solos de bandoneón, praças impossíveis). Ela de cachecol xadrez. Eu gostaria, também de experimentar o assassinato com requintes de crueldade, planejar a coisa. Tenho que ouvir alguns discos e ler meia dúzia de livros. Mas não passo sem comer cocô de louco. Um dia - vestido de arlequim, eu mesmo - me lanço do alto de um prédio de trinta andares. A grande jogada, creio, é se matar depois de velho, vingar-se plenamente."

Marcelo Mirisola, O Azul do Filho Morto.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Como alguém consegue colecionar figurinhas repetidas?

segunda-feira, 2 de novembro de 2009


Hoje é dia de finados! Eu quero presente, portanto... =]

domingo, 1 de novembro de 2009

Mãos cálidas e ao mesmo tempo geladas, que congelam meu corpo e derretem minha alma. Dedos sorrateiros que estrangulam meu pescoço, palavras caladas que calam meu pranto e pronto, se foi - também.
Também deixei meu tênis desamarrado
só pra ver se alguém repara em mim na rua
e meu cabelo desarrumado só porque
ninguém repara em minha bagunça

Também tomei um trago pra ver se esqueço
pra ver se desapareço dissolvido em álcool
meu violao são notas tortas [que enchem buracos]
das coisas que perdi pela vida afora

Encha meu copo, pra beber com meu amigo imaginário
tranca a porta do quarto, enquanto eu aperto o meu laço

Também joguei com todo tipo de sorte
pra ver se alguma me dava um caminho
que depois eu digo que encontrei sozinho
meu bem, o que eu queria era o seu decote [vem comigo]

Desarruma a cama, finge que se esconde na coberta
me engana que sonha comigo enquanto me espera

Desinteressados tragos
desinteressados tragos

sábado, 24 de outubro de 2009

"Gostoso como a bala de goma,
Macio como algodão doce,
Vicia como chocolate,
Inebria como o licor de cacau!"

sábado, 10 de outubro de 2009

Paixão... Resoluta e desenvolta. Minha paixão pé-de-valsa que dança como se flutuasse, pés descalços que correm as nuvens que se fazem chão. Toda gingado, toda rebolado. Paixão toda louca, mas com um lindo passo ritmado que segue a canção que ninguém toca, e que apenas você e eu escutamos, sussurrada ao vento e ao vazio. A própria paixão assoprada, por lábios macios, delicados, que temem desmanchá-la só por criá-la, dissolvê-la antes que seja plena – mas é plena no instante em que existe, nada mais, não exige mais. Ritmo, tonalidade, tudo se encaixa sem que ela procure se encaixar a eles. Já nasceu melodia, se fez toda a harmonia em seu sorriso em lá menor. Notas musicais de um perfeito timbre que embalam – dois passos para lá, dois passos para cá – o aconchego dessa paixão apaixonada. Passos ensaiados, passos certeiros e bem colocados, mas também improvisos de pura excitação, loucura de músico experimentado, mas que não é música, e sim paixão pura e ritmada, ao som da noite escura que deixa cair notas maravilhosas da ponta de seus dedos mágicos, em seu instrumento apaixonado. Paixão demasiado apaixonada.

domingo, 27 de setembro de 2009

Puedo escribir los versos más tristes...

Puedo escribir los versos más tristes esta noche.

Escribir, por ejemplo: "La noche está estrellada, y tiritan, azules, los astros, a lo lejos."

El viento de la noche gira en el cielo y canta.

Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Yo la quise, y a veces ella también me quiso.

En las noches como ésta la tuve entre mis brazos.
La besé tantas veces bajo el cielo infinito.

Ella me quiso, a veces yo también la quería.
Como no haber amado sus grandes ojos fijos.

Puedo escribir los versos más tristes esta noche.
Pensar que no la tengo. Sentir que la he perdido.

Oír la noche inmensa, más inmensa sin ella.
Y el verso cae al alma como al pasto el rocío.

Qué importa que mi amor no pudiera guardarla.
La noche está estrellada y ella no está conmigo.

Eso es todo. A lo lejos alguien canta. A lo lejos.
Mi alma no se contenta con haberla perdido.

Como para acercarla mi mirada la busca.
Mi corazón la busca, y ella no está conmigo.

La misma noche que hace blanquear los mismo árboles.
Nosostros, los de entonces, ya no somos los mismos.


Ya no la quiero, es cierto, pero cuánto la quise.
Mi voz buscaba el viento para tocar su oído.

De otro. Será de otro. Como antes de mis besos.
Su voz, su cuerpo claro. Sus ojos infinitos.

Ya no la quiero, es cierto, pero tal vez la quiero.
Es tan corto el amor, y es tan largo el olvido.

Porque en noches como ésta la tuve entre mis brazos,
mi alma no se contenta con haberla perdido.

Aunque éste sea el último dolor que ella me causa,
y éstos sean los últimos versos que yo le escribo.

[P. Neruda]

sábado, 26 de setembro de 2009

Hoje vou levar você ao parque. Tomaremos sorvete debaixo de alguma árvore – até deixo que suje a ponta do meu nariz com o seu sorvete de chocolate, mas apenas porque, instantes depois, estará com boa parte do meu, sabor morango, em sua testa. Passearemos por entre as muitas pessoas que estarão por lá, absortos em um mundo que nós mesmos criamos, onde o parque e o resto são meros devaneios de algum louco. Carregarei você para o trem fantasma, com a esperança de que se assuste com algum monstro de mentira e me aperte a mão com força. Tirarei sarro se você tiver medo de algum brinquedo, mas não obrigarei que vá onde não quer. Tento ganhar um ursinho de pelúcia para você no jogo de derrubar todos os copos com uma bolinha, mas talvez seja você mesma quem vá conseguir tal feito e ficarei satisfeito com meu novo amigo sintético – mesmo tendo meu papel de garoto que quer impressionar roubado por sua melhor pontaria. Talvez o urso seja chamado Bob, ou Charlie, e que tal Teddy? Quando ele chegar, perguntarei seu nome. Da roda gigante gritarei alguma coisa, bem lá do alto, para todo o parque ouvir. Imitaremos o homem sombra, o que pensará o imitador de ser imitado? Vamos correr descalços pelo gramado e cairemos fatigados em alguma sombra para respirar, descansar... e depois chegar onde está armado o circo! Com seus palhaços amestrados, que cantam, dançam e sorriem ao mesmo tempo. Engolidores de fogo alcoólatras e de ressaca. Malabaristas, brincando com objetos pontiagudos no ar, e dançarinas de todas as partes do mundo. A pipoca tem gosto de pipoca de verdade, e você sorri um riso de verdade. Mais palhaços, mais macacos. Mais espetáculo. Agora vem o raivoso adestrador de leões, que perdeu o cargo depois que um de seus felinos se recusou a fazer o que mandava e bocejou para o público – em meio ao bocejo contaminado de toda a platéia ficou com duas opções: ou virava palhaço de uma vez, ou começava a atirar facas na mulher do acrobata. Atira facas desde então – a mulher do acrobata ora reclama que ele não tem pontaria alguma e quase a mata toda vez, ora reclama que seu marido exige demais dela na cama graças aquela desenvoltura toda com o próprio corpo, uma dupla infelicidade para a moça. Mais palhaçadas e senhoras e senhores isso é tudo por hoje. Cortina cerrada, nem uma viva alma no picadeiro e acabou minha pipoca. Pego sua mão e vamos embora por ruas cheias de lua até nossa casa guardada debaixo da cama em uma caixa de sapatos que só nós dois conhecemos. Entramos em casa e deitamos em lençóis azuis da cor do céu, você aninha sua cabeça em meu braço, puxo o cobertor repleto de estrelas e tiro um pouco de poeira de sonhos que caiu sobre o travesseiro. Digo: boa noite, minha querida. Você sorri ainda um riso de verdade. E adormece, no quarto recém criado.

segunda-feira, 21 de setembro de 2009

São estas vontades que me importunam miseravelmente – e estas esperanças que me distraem. Tão bom seria esquecer as coisas que me desagradam, mas então deixaria quase tudo para traz – lembraria quase nada. Maldito pessimista, que não vê graça na vida – que como eu, não vê graça em nada.
Eles continuam me chamando.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Eu conheço você por debaixo da maquiagem, cada traço mal traçado e marcas demasiado profundas. Procurei justamente os arranhões que sua vida deixou impressos em seu rosto, as meias-tintas que os podem cobrir não me são suficientes. Mexi em sua bagunça, porque todo bagunceiro encontra tudo o que procura, nos lugares mais inusitados em que largou alguma coisa, e ninguém entende como isso acontece. O quê é isso além de ser plenamente você em estado bagunçado? Mais do que a perfeição do seu sorriso, eu amo a desorganização de sua vida que é tão-somente sua e de mais ninguém. Cada bagunça é unica de seu dono, mas quantos milhares de sorrisos iguais eu encontro? Com muitos ou poucos dentes, meia-boca ou boca e meia. E a sua bagunça só você conhece, você não a disfarça. Ao contrário daqueles outros cantos muito organizados da sua vida, que se escondem debaixo do tapete, eu prefiro a poeira na parede e o pó nas janelas. Desconcertante sujeira, eu não reclamo, sou todo trapos mal lavados. Guardo um segredo, te vi sem maquiagem. Gostei do que li em seu rosto. Adoro seu corpo todo marcado. Tenho esse amor todo louco pelo seu inconveniente, enquanto os outros te ignoram tudo. Eu olho para você e procuro enxergar lá dentro, onde você é tudo o que quer ser. Eu vejo como você é linda sem maquiagem e me procuro, lutando contra a sombra em seus olhos, em algum lugar mais perto de você do que o resto das coisas. Eu vejo uma cicatriz sussurrada para fora da pintura e me pergunto se esse sussurro é para mim ou é para toda a noite. Concordo com o mundo ao nosso redor: você é maravilhosa maquiada. Mas sou todo suspeito para dizer isso, porque para mim você é linda mesmo ao acordar toda borrada por tintas da noite anterior, com o rosto achatado, abarrotado e amassado, com o travesseiro marcado nele. Devo dizer, contudo, que gosto sobremaneira da sua pintura, porque seu rosto dileto de muitos só eu conheço em plenitude e todo manchado.

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

“Já é tarde, já é tarde” é o discurso voraz de minha louca insanidade – essa minha lúcida loucura que, quando vejo por aí, corre como uma criança inocente e chora como um velho rancoroso, acima de tudo voa (e muito bem), sai pela janela do quarto andar sem passos trôpegos, sem espera e voa. Que belas asas você tem, talvez sejam tão belas quanto as minhas. Mas as que tenho já se atrofiam e as que vejo são as suas. Talvez eu devesse te dar ouvidos, porque tudo em mim se atrofia – por falta de uso, ou por uso indevido. Será que se atrofia ou apodrece escarnecendo em longeva tristeza? Discurso loquaz esse teu, mas será que não te dou ouvidos? Talvez eu já esteja vivendo essa vida que você me criou.

Perdi o sono enquanto te desejava boa noite, quando disse “você vicia” sussurrado em teu ouvido. Agora, quando durmo, sou todo dormir sem sonhos. Agora, quando durmo, sou dormir sem ter sono, sou sonhar sem ter sonhos. Foi logo depois de você adormecer que vi passar minha loucura com suas belas asas eternas me chamando. E agora eu olho alheio, enquanto espero, absorto. Mas eu olho, e vejo, aquilo que meus delírios já diziam, enquanto todos e eu mesmo apenas olhavam para eles e sorriam. Já é tarde, já é tarde, agora sou eu com as mesmas falas de minha insanidade solícita.

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

As lembranças em minha cabeça se misturam e pavoneiam para de madrugada virarem em pesadelos que me incomodam e acordam, me dissolvo em reminiscências. Me perco em um sonho demasiado triste. Muito sono e poucos sonhos, e quando sonho é isso. Vou esperar que amanheça, para me esconder debaixo de alguma qualquer coisa. Deitarei em algum canto, e adormeço. Vivendo a vida a contra gosto.

Resto
de nada
caco
velho

jogado às pedras
para que apodreça.

sábado, 5 de setembro de 2009

Vou fazer um caminho com o perfume que você gosta até a minha cama, e não deixo você nunca mais sair. Livros, vícios, filmes e sons, deixo tudo debaixo do travesseiro, escondidos com um carinho exagerado, para que você encontre todas as noites tudo isso, comigo, em todo momento ou algum dia. Tenho um pouquinho de cada coisa que você gosta bem aqui, aquilo que você foi deixando de si mesma comigo e que agora faz parte de mim. Silêncio e sombras, guardei um monstro no armário e alguns medos debaixo da cama, para o caso de você precisar deles. Algum susto, por diversão. Pintei estrelas pelo quarto e apaguei a porta do lugar. Não preciso do mundo lá fora. Delírios insensatos de uma mente ingênua, desenhar o céu para que você possa tocá-lo. Por outro lado, sua própria ingenuidade talvez não deixe que perceba que esse céu estrelado - desenho mal feito - só passa a ser real depois do seu toque.

terça-feira, 1 de setembro de 2009

segunda-feira, 31 de agosto de 2009

Várias vezes, no decurso da minha vida opressa por circunstâncias, me tem sucedido, quando quero libertar-me de qualquer grupo delas, ver-me subitamente cercado por outras da mesma ordem, como se houvesse definidamente uma inimizade contra mim na teia incerta das coisas. Arranco do pescoço uma mão que me sufoca. Vejo que na mão, com que a essa arranquei, me veio preso um laço que me caiu no pescoço com o gesto de libertação. Afasto, com cuidado, o laço, e é com as próprias mãos que me quase estrangulo.
[Bernardo Soares]

sexta-feira, 28 de agosto de 2009


Saudades da menina dos meus poemas.

quinta-feira, 27 de agosto de 2009

Sou todo tormenta por dentro. Dores ao horizonte que fazem vezes de negras nuvens, esperanças que bóiam desesperançadas em algum oceano que sequer se turva por elas. Vivo em dois mundos que se anulam, também me anulo em ambos. Atormentado por mim mesmo, que se cansou de ser o que sou, acorrentado a meu outro que é além de minha morte. Sem ele eu não existo; só ele, já morri. Por ser já não sou. Todo momento, comigo mesmo, ombro a ombro não me reconheço. Deixei lembranças e saudades para traz, até chegar ao dia de hoje, em que já não passo por mais do que algumas pegadas em lugar nenhum.

quarta-feira, 26 de agosto de 2009

Cor sem cor, que conheço de cor e não canso de decorar e aprender – mas que ainda não sei bem também. Mancha que marca minhas veias marcadas, mancha deixada para mim que marcou minha ferida intocada. Mancha que agora é minha e me deixou manchado. Marcas, marcas na garganta. Macas, macas.. Saudade só passado, cor sem cor, não me deixa só, passado.

Embolados, enrolados, largados em qualquer canto
amassados, corpos misturados que já nem sei também
quem sou eu, ou ela, onde acabo e ela começa
O que é aquilo ou de onde vem? Ô meu deus!

Embolados, bola de gente amassada que parece,
e ninguém entende nada, este pé é meu ou teu?
Nem tenho idéia que é pé, e o que cabeça,
onde que eu termino e você já começa.

Estou um pouco em mim e muito sou ela,
nós somos um só que parecem dois corpos,
em algum canto, sobre a cama, debaixo dela.

Estamos juntos e misturados, de pé e deitados,
mais que enrolados, apertados, enganchados,
de perto, mais perto, e bem embolados.

[Feito bola de gente]

Eu?

terça-feira, 25 de agosto de 2009

As pessoas que você vê pela rua
são tão diferentes de você que
é impossível que alguma delas
seja sua metade que te espera.

Eu aposto que a noite chega
e você não lembra como eu
gosto de acordar com teu cheiro
[no travesseiro]

Levando a vida a contragosto
em desespero me encosto na
porta pra ouvir la fora
se volta algum passo [teu]

Talvez demore tanto e quando chegar
já não sei mais o que espero e
posso não entender o que vejo
porque deixei de acreditar.

Talvez eu esqueça a cor da tua pele
que se perde em minha lembrança
[e morre]

Talvez eu não lembre amanhã as cores
de nossas saudades de possibilidades
[futuras]
O mundo ideal está na imaginação do próprio homem que o criou e daqueles que lhe acreditam. Mesmo sendo uma criação humana, surgiu como transcendendo a sua própria capacidade. Os sonhos de perfeição se encontraram todos num outro plano onde todas as coisas o são em plenitude de ser. Aglomerado de sonhos e esperanças, que mesmo tocados pela imperfeição podem ser perfeitos, a única coisa que a humanidade criou de aprontado está além de seu alcance. O mundo das idéias está na abstração de um homem sonhador do sublime. Como será viver por entre sonhos?

Por um lado, não se pode chegar a este estado de completo ser. Já foi tudo criado para não se alcançar. Mas por outro, algumas coisas chegam tão perto do passo decisivo para a transcendência de si que por instantes se vislumbram pequenas centelhas de sonhos por toda tua capacidade perceptiva. Olhos descoloridos pela vida encontram a plenitude da alma através de caminhos muito seus e sutis. Os meus se ofuscaram no brilho eterno do sonho de viver em sonhos. O que é o amor além disso? Esperança contumaz de que esteja lá – comigo.
Começo este breve diário a partir do ponto final, que é para lembrar que todas as coisas são feitas para acabar. É também como me lembro a vida. Inicio com vistas no Fim. Deixarei aqui muito do que restou do que fui – e quando escrever a última linha, talvez já tenha perdido a primeira.

Anoto coisas as quais quero lembrar, então, por favor, não me esqueça.

Pasmo sempre quando acabo qualquer coisa. Pasmo e desolo-me. O meu instinto de perfeição deveria inibir-me de acabar; deveria inibir-me até de dar começo. Mas distraio-me e faço. O que consigo é um produto, em mim, não de uma aplicação de vontade, mas de uma cedência dela. Começo porque não tenho força para pensar; acabo porque não tenho alma para suspender. Este livro é a minha cobardia.
[Bernardo Soares]