quarta-feira, 16 de dezembro de 2009

Sorrisos, orgasmos e lágrimas.

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

"E deslizo para esta solidão demasiado humana de não poder voltar a ser sozinho, como era quando tu existias, nesta mesma cidade, e eu já nem sequer pensava em ti."

Inês Pedrosa

Porque já agora tudo que espero vem de você, afinal. Sabe aquela velha imagem que fiz de ti? Não errei em nenhuma pincelada. Ou, na verdade, talvez seja ao contrário - a responsabilidade de tanto acerto é sua apenas. Tenho culpa por ter encontrado você? Se era justamente quem eu procurava! Agora fico lembrando de como você acordava pela manhã - com a cara amassada e apregoada por uma marca de travesseiro. Bom dia com alegria, é uma delícia acordar do seu lado toda manhã, minha querida. Como me divertia com as brincadeiras criadas no afã do romance! As frases que criamos juntos e decorávamos para dizer a cada deixa. As cócegas e jogos bobos - olhar nos olhos e ficar sério!

"O que está olhando? Pára de olhar para mim, não gosto!" Faço cara de bobo, e digo coisas tolas nessa brincadeira gostosa de amar. Fico te observando, me perco em seus olhos. Consegui ver tantas coisas! Como na última vez que procurei algo ali: nem te conto o que encontrei! Mas então tudo se foi, e fiquei apenas com o gostinho do que diziam seus olhos. Maldito gosto agridoce difícil de esquecer. Também que não estou tentando, em absoluto. E nem te conto o que encontrei!

Faço cara de bobo e fico perdido te observando. "O que foi? Pára de me olhar". Sabe o que é? Lembra daqueles filmes romântico-clichês em que quando o garoto vê a menina que vai amar pelo resto da sua vida fílmica o tempo pára? Pois! Fico te observando e o tempo pára. Mas nunca ninguém explicou que o tempo não pára para todos, então, entro em stand by curtindo meu tempo parado e o que você vê é uma "cara stand by", porque estou perdido numa profusão de sentimentos dos quais você faz parte, mas que estão guardados bem seguros aqui dentro - me perco por ali, e meu corpo fica distraído. Deve ser uma careta digna de Calvin & Haroldo, no mínimo. Pronto, falei o segredo da cara de bobo! Careta stand by enquanto eu morro e renasço, crio e desapareço dentro de mim e perdido em seus olhos.

Diabos! Como é difícil escrever essas coisas. Saudade imensa de tudo que foi e de todas as possibilidades futuras.

Tentar esquecer dói, porque é lembrar que se tem que esquecer. Dói porque tentar esquecer faz lembrar, e também lembra o porque de se querer esquecer. Mas quem colocou essa palavra aí no meio? Foi você? Porque eu não fui: jamais esquecer. E quanto a parar de pensar em você então! Besteira absurda! Antes teria que mudar minha vida, meu quarto, meus móveis - eu mesmo e comigo tudo que acredito e também aquilo que amo. Seu cheiro está por aqui, seu gosto, seu calor, a marca de seu corpo na cama onde deitou comigo. Intragável tentar ignorar isso. Não quero. Ainda guardo um pouco do perfume que você gosta, para usar para você.

"Sempre vivi em teoria, assustada com os buracos negros entre fulgurações - muito mais do que tu. Assim nos encontramos agora - eu, filha de um Deus desleixado, tu, fervoroso praticante das distâncias impensáveis. Não sei pensar sem ti. Deslizo pelas esponjosas paredes da morte e capto a revelação da tua orfandade - não sabes amar sem mim.

Nós éramos um do outro. Coincidimos e rejeitamos a coincidência, com a petulância típica dos pobres, confinados à prisão do seu sofrimento. Nós éramos um do outro e não descobrimos, preferimos respeitar os protocolos da nossa era, dar prioridade à voz obrigatória do corpo. Nós éramos um do outro de outra maneira - de uma maneira escura, espessa, transcendente. O que podíamos nós, escravos da Inteligência Suprema, escutar de transcendente? Como podíamos nós, ilustres servos da História, alcançar a luz trêmula do pequeno milagre que nos era dado?"

Inês Pedrosa

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

O Urso de pelúcia e a Bailarina da caixinha de músicas

Acordei assustado - nem durmo direito e acordo assim ainda por cima! Olho ao lado e encontro sua caixinha aberta, minha Bailarina. Acordei pelo som ou pela vontade mesma de ver a ti? Será meu desejo tão intenso que o simples estalo da pequena e frágil tranca se abrindo possa me acordar? Quase certeza que sim.

Porque sei que esperava ansioso você aparecer para mim novamente. Afinal, não consigo esquecer de você, meu bem. Depois de te ver dançando ao som daquele piano muito bem arranjado, com seus passos deliciosos. Malditos passos treinados, agora estou viciado nessa música e em você.

Que tesouros podem estar guardados na caixinha além de você mesma? Não sei. Eu só vejo a ti e não acho que possa existir algo mais. Gosto de imaginar que dança só para mim também. E invente esses passos maravilhosos só para mim! Me olhe entre uma pirueta e outra, me deseje enquanto te desejo também. Que loucura foi aquele dia em que pensei que me olhava! Uma olhada meio distraída de minha parte e, de repente, parecia que você estava me observando - e me enxergava. Era assim? Você me viu naquele dia? Diga que sim, diga que sim!

Continuo te olhando, procurando essas coisas. Não me faço de rogado, estou aqui te observando. Meu alento é te ver dançando e só. Esperando que olhe para mim em troca. Quero passos de uma dança apaixonada para mim e para dançarmos juntos.

Você parece tão triste às vezes. Ensinada a dançar toda vez que a caixa se abre, nada mais. Passos desenganados, afinal, são todos iguais. São todos iguais? Perceba, minha Bailarina, que vejo tudo diferente, tudo muito e possível em suas mãos. Eu me postaria sem reclamar bem aí do seu lado e te mostraria isso, mas não sei se é o que você quer. Digo que nada é o mesmo, Bailarina, a partir do momento que você dance por alguma coisa. Dance por mim.

Talvez seja eu. O brinquedo quebrado e velho no canto do quarto pode ser seu verdadeiro espectador! Olhe para mim aqui, debaixo da cama. Espere! Deixa eu pegar ali meu braço que caiu. Agora sim, olhe para mim. O que achou? Dance para mim porque acredito que só eu enxergo o que você é, não vejo sua dança apenas, sabia? Procuro a plenitude desse amor em cada passo teu, e você mesma em cada um deles, mas não faço de sua dança tudo o que você é. Eu só estou distante porque não deixa que me aproxime - porque não sei se quer que eu chegue perto.

Luto contra o pó que cobre meus olhos para conseguir te ver sair de sua caixinha. Eu quero te ver. Eu quero te ver! Pelo amor de Gepeto, Bailarina. Eu quero te ver! Como posso te esquecer se cada vez que sai de sua caixinha você parece ainda mais linda? Será que você espera ansiosa para me ver? Diga que sim e eu me arranco da minha condição mesma de brinquedo estropiado, guardado numa infância desgastada - debaixo da cama - e vou até aí te buscar! Mas eu nem sei dançar... Eu nem sei dançar e desejo a linda Bailarina da caixinha de músicas.

Você deve estar apaixonada por algum dos soldadinhos de chumbo, imagino. O que te faria olhar para um ursinho de pelúcia maltrapilho? E tem todo esse maldito pó que guardam debaixo da cama junto comigo. Malditos soldadinhos de chumbo!

Ainda assim, sonho em algum dia ser seu par ideal numa dança eterna quando a caixinha se abre, embalados por notas brandas dançando de corpo colado, e depois nos guardamos novamente. Todos os outros te vêem dançar, Bailarina. É suficiente para eles. Mas eu quero estar com você quando estiver dentro de sua caixa, não quero apenas a dança perfeita, mas também a claustrofobia
da caixa - do seu lado.

Não consegui prender novamente meu braço esquerdo que caiu mais uma vez. Um de meus olhos está preso por um fio apenas, logo cai. Minha orelha direita se perdeu numa brincadeira - no tempo em que eu ainda era brinquedo novo. Tenho pó e sujeira por todo meu corpo de pelúcia. Não consigo sequer derramar uma lágrima, por você e para me limpar. Porque sou todo brinquedo. Guardei, contudo, esse coração no meu peito que diz "eu te amo", costurado de forma tosca aqui, para te entregar um dia, Bailarina. Olhando bem, esse coração é tão mal feito que acho que sou brinquedo dos mais baratos. Olhando bem, acho que vou ter vergonha de entregar uma coisa tão feia para uma bailarina de cristal que dança ouvindo notas tão delicadas de piano. Talvez a parte debaixo da cama seja meu lugar, e aqui eu dava guardar essas coisas

Mas o pó continua incomodando.

Continue dançando, por favor, mesmo que não seja por mim, porque vou continuar imaginando que você me enxerga - mesmo que talvez não me veja.

Bailarina, eu amo você.