sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Buk

preciso de uma boa mulher, preciso de uma boa mulher
mais do que da máquina de escrever, mais do que do
meu automóvel, mais do que de
Mozart; preciso tanto de uma boa mulher que posso
senti-la no ar, posso senti-la
na ponta dos dedos, posso ver calçadas construídas
para seus pés caminharem,
posso ver travesseiros para sua cabeça,
posso sentir a expectativa da minha risada,
posso vê-la acariciar um gato,
posso vê-la dormir,
posso ver seus chinelos no chão.

eu sei que ela existe
mas em que parte deste planeta ela está
enquanto as putas continuam me encontrando?

Charles Bukowski

Quando esse Velho Safado não está falando de uma boa trepada ele chega a ser romântico. O que me incomoda é pensar se ele conseguiu encontrar tal mulher. Morto aos setenta e quatro anos, será que ele encontrou? Pode ter passado uma vida inteira procurando por uma coisa que nunca chegou, talvez tenha melhor sorte. Duvidar das coisas torna tudo mais doloroso, você sente em dobro. Preferia uma crença cega de que estou fazendo a coisa certa e ficar quieto no meu canto, mas não tenho essa dádiva então procuro e duvido de tudo e questiono esse absurdo cotidiano. Espero chegar lá um dia.

terça-feira, 27 de setembro de 2011

Sento à janela e sorrateiramente acendo um cigarro com um estalo da chama entre meus dedos. Sento e sinto o vento que carrega a fumaça pro lado de lá da minha vida no parapeito da janela entreaberta. Ouço a um passo abaixo o burburinho das pessoas que passam despreocupadas entre calçadas mal pavimentadas cheias de lixo e lágrimas. Vejo quando olham para cima uma centelha de vida, um resquício de morte e um pouco de maquiagem borrada escorrendo entre seus dentes amarelados pelo fumo e a fome. Dou uma tragada longa para encher os pulmões e solto mais uma nuvem da tempestade que se forma sobre minha cabeça, a tormenta que chega a passos brandos e calculados como algum filho da realeza. A real tristeza de caminhar pelo parapeito em prantos de sublime extemporâneo meditativo: nada. Passos brandos e calculados de algum filho da puta que acendeu um cigarro e joga a bituca ainda acesa na cabeça de alguém que passa lá embaixo despreocupado.