sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Como se não houvesse amanhã, larguei tudo que havia em minhas mãos e sai correndo por aí, porta a fora, voando pela janela mal encaixada na realidade do cotidiano pintado a tintas que não combinam com minhas cores favoritas. Então deixei meus medos para traz e comecei a viver de minha imaginação que cria todo dia o que preciso para ser. Louco de amor pela vida, a relva debaixo de meus pés fazendo parte de mim, o cheiro de chuva que exala do asfalto quente, o som do vento no arranha-céu, a beleza do sorriso sincero no rosto daquele que sofre mas é feliz. Uma árvore que brota de dentro do concreto e é abstrata! Tudo que pude crer que era o belo jamais será tão bonito quanto apenas enxergar a beleza que existe em algo que não pode ser chamado arte. A coisa mais tocante é a arte natural que nasce em qualquer calçada, é a nota musical que ecoa de um motor, ou do canto de um pássaro, coisas inalcançáveis, inatingíveis, coisas que apenas são e não pedem licença para existir. Sentir o mundo em sua plenitude talvez seja mais bonito do que transformá-lo em arte. Morre-se tentando. E a luz do sol está lá fora, para queimar-lhe a face, junto com o vento que sopra para emaranhar-te os cabelos. Vá embora e manda um postal do infinito!

quarta-feira, 5 de janeiro de 2011

Minha querida Bailarina,


Faço esse texto em sua saudade.

Isso aqui é um lamento com algumas rimas. Mal estar recitado, essa falta que você me faz virou arte. Saudade, saudade, saudade. E nem sei de quê. Se você aparecesse bem agora, eu não teria imaginação suficiente para fazer qualquer coisa que não lhe abraçar e ficar intocado, inabalável ao seu lado. Intoxicado com tanto amor no sangue que corre em minhas veias. Ataques, ataques, ataques, ataques epiléticos de prazer incomensurável por sua culpa, paixão de loucura. Pode parecer chato ficar quieto ao seu lado, mas há muita sinceridade em meu silêncio. Eu me explico calado.

Essa saudade toda ainda me mata algum dia! Ah, se mata! E não venha declamar então que me amava, porque aí vai ser tarde. Mas, eu terei imortalizado você em minhas letras e minhas dores. A exemplo de Kerouac, você é minha desamparada Tristessa. Minha bailarina de pés descalços que dança sobre a eternidade da noite e do céu, a imortalidade da alma reside no sentimento criado ao ver seus passos elegantes na imensidão do infinito. E você nem sequer se dá conta disso tudo que significa para mim, observar você. Tê-la em meus braços, abraços eternos.

Segura em meu braço e vamos embora! Para onde? Que pergunta boba: não importa!

Bosta, malditas memórias – queria essas lembranças esquecidas em qualquer lugar. Empoeiradas e bonitinhas como um álbum de fotografias que eu pudesse pegar só quando quisesse. Esconder no armário, debaixo da caixa onde está guardado o gosto de seu beijo e aquele seu falatório infinito sobre as mesmas velhas histórias que sei de cor e não me canso de ouvir. As gavetas em meu peito deveriam ter tranca, e que alguém mais sensato do que eu guardasse as chaves. Essa lembrança parece uma foto amassada e marcada pelo tempo, mas ainda muito nítida para conseguir jogar fora.

Ainda escrevo esses poemas, por quê? Por quem e para quem?

Um dia esqueço, mas não resistiria a escrever também esse esquecimento.

Estou aqui nessa selva de esperanças. Onde as árvores têm nomes de desejos e vontades, e as folhas multicoloridas no chão são sonhos despedaçados. Caminhando, caminhando, caminhando floresta adentro, densa, folhas escuras, algumas fogueiras: feitas pelos sonhadores decepcionados que resolveram se vingar de sua decepção queimando seus sonhos no meio do nada, calados. Melancolia de noite e de dia-a-a. Esse caminho não tem fim, acho que essa floresta na verdade está plantada em meu peito e tudo em volta são nossos desejosos planos que viraram nessa Amazônia dos sonhos! Quem diria que isso não viraria tudo em pântano e lama, muita lama. Que mal tem em dar uma de jardineiro e cultivar algumas impossibilidades plausíveis? Algumas dessas árvores parecem centenárias. Outras acabam de aparecer. Mesmo que todos achem que nessa terra não nasce mais nada, lá vou eu com meu regadorzinho e uma pontada no coração que grita essa pequena dor de saudade. E voilà, brotou outro sonhozinho ali, com pétalas azuis manchadas com branco.

Lá! Sentada na relva de minha saudade – ou nossa – está você, lendo um livro à sombra. Esse sol está mesmo de matar. Pronto, fez-se a noite. Aqui tudo é possível, é meu sonho de alguma noite de qualquer estação que eu quiser e sempre. É noite. Sentada na relva à noite, espera a minha chegada para o piquenique. Com algodão-doce e brigadeiro, só porcaria – mas que graça teria um piquenique saudável? Que graça teria um piquenique sem você? Eu não sei, nem me pergunte. Enquanto isso...

Para onde agora?

Ao circo, ao cinema, ao movimento frenético de nossos corpos entrelaçados em minha cama. Não tem mais rima em lugar nenhum! Cadê a poesia? É só saudade para todo lado, borrifando em meu rosto. Foi o Ferlinghetti que disse que nem todo o mundo tinha uma vida interessante para encher um livro sem revisão, não é? Acho que sim. Não devo ter uma vida dessas, mas minha única leitora é o que basta. E basta essa saudade para que todo texto seja pura poesia. Esse pedaço de saudade que sigo mascando como um chiclete que não tem fim nunca, como o do Willie Wonka. E esse amor é uma barra de chocolate dele também, com um sabor irrepetível, inigualável, que eu nem sei explicar que gosto que tem.

Minha linda Bailarina, um dia eu arranco essas suas malditas sapatilhas a dentadas e descubro se você é de verdade. Eu ainda amordaço essa sua mística e calo a boca de toda sublimação por parte da minha alma. Ainda falo contigo em algum café qualquer, fumando um cigarro infinito, de alma para alma. Desce desse palco e vem para a platéia comigo, vamos embora do teatro no meio do espetáculo – e pedimos o dinheiro de volta na saída! Eu ainda surpreendo essa gente toda por não ser o que deveria ser. Enquanto todos dizem “não, não” segura em minha mão e vamos caminhando por entre as fileiras – as cortinas ainda abertas, mas sem show essa noite. Sem maquiagem, sem texto decorado ou improviso santificado no altar da divina arte. É absurdo é surreal é belo mas não é arte. É pura invenção da loucura, que não nasceu para ser coisa alguma que não seja ela mesma – sem forma nem conteúdo. E lá vamos nós. Nus.

Chama o manobrista para buscar minha abóbora. Fechou o estacionamento, passa da meia-noite. Que bosta, vamos correndo correndo correndo, até chegar a lugar nenhum, sentar em algum banco de praça no vazio, com passagens de trem sem nada escrito nelas, sem destino, sem malas, sem trem. Acendo um cigarro e acaba a história, para começar outra, claro. Chegou o trem “mas não tinha trem” agora tem e já vai partindo com suas despedidas chorosas com lencinhos brancos, fumaça, fumaça, e alguém notou que não há trilhos: para onde vamos? Não sei! Não temos nem trilhos e você me faz uma pergunta besta dessas?!

Para onde agora? Só poderíamos saber juntos. Ou talvez já estejamos a caminho do tal lugar, e quem chegar primeiro espera um cadinho só. Estou chegando.

Dedico essas linhas a suas sapatilhas que dançam sobre minha cabeça atormentada pela loucura dessa

Saudade do impossível,

Bom dia, minha linda Bailarina.