sábado, 18 de setembro de 2010

Afável melancolia lhe chama em surdina
para contar aos sussurros em seu ouvido
as desventuras de mais um dia

Sua inegável ausência encara e grita
assusta minha pobre alma aturdida
que não sabe o que fazer

Gostaria de dizer tanto mas minha boca
desconhece os mistérios de seu idioma
fico nervoso, com cara de bobo


com carinho: meu coração, feito de brigadeiro.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Coisa estranha esse ser humano. Para começar uma dicotomia lhe é inerente e intransponível, além de técnicamente característica: a diferença e possibilidade de ser ou não civilizado ou instintivo. Ser civilizado é morar num lugar onde não exista qualquer manifestação estritamente natural - se houver alguma árvore ela foi plantada e escolhida a dedo para combinar com as cores da flor que está no canteiro ao lado -, agir de forma a modelar qualquer ação embasada pelo prévio temor à originalidade e negar absolutamente qualquer traço personal que não possa ser entendido pela maior parte da população com voz ativa; mas, ser civilizado também é para aqueles que vivem no campo, contudo, o conceito se lhe impõe como a vontade de viver na cidade ou a possibilidade de visitar o composto civilizacional, além de poder se vestir igual, assistir às mesmas coisas na televisão de marca renomada internacionalmente. Por outro lado, não querer ser urbano significa um atraso conceitual na noção de pós-modernidade. Ser civilizado é também conhecer as evoluções e revoluções mundanas, posto que se você se deixa à parte dessas coisas acabara taxado de analfabeto funcional, população marginal, ou simplesmente burro. A civilização está na agenda de telefones do seu celular. E o instinto? Esse não existe mais de forma pura, em absoluto - ao menos é o que todos pensam. Bom, continuo sofrendo os infortúnios de ter instintos numa sociedade controlada. Assim como todos. A diferença é que além dos instintos animais, tão comuns à espécie humana, agora deu-se por criar instintos sociais também - para me infernizar a vida - como ignorar o instinto do amor? Outrora o ser humano animalesco era convencionado a procriar, agora é a busca pelo parceiro ideal da família conservadora burguesa ou então o instinto de autodefesa e preservação do eu-narcisista em busca da plena consciência de si através do sexo e relacionamento sem profundidade emocional que desestimula o laço matrimonial ou qualquer ligação restrita. Uma adaptação do instinto animal para a vida social. Você tem medo de ficar sozinho ou de ficar preso a alguém, segue seu instinto social de relação inter-pessoal. Pode parecer um tanto confuso, um instinto que não é ligado a algo como a natureza humana; mas, o ser humano agora é social e não natural.

Diferença entre animal e humano. O humano saiu da natureza e não é mais considerado (por si mesmo) como um animal - mas, nossa unica diferença com o restante das espécies desse planeta é que não conseguimos mais viver nesse lugar. Temos que criar incondicionalmente materiais que propiciem nossa vida aqui. Fora isso é o que? Um dedo diferente ou a capacidade de sonhar e projetar? Também existem as linhas de crédito para nos diferenciar de seres inferiores segundo Darwin. É natural não ser natural e viver em bolhas de civilização?

Outra coisa interessante no ser humano é a sua dificuldade de viver com seres de sua própria espécie. Isso deve ter alguma coisa a ver com a História e a alteridade. De alguma forma deve estar relacionado ao capitalismo. Talvez um pouco de individualismo depois do século dezenove para a frente. Vai ver é a tecnologia. Eu não sei como chegou até aqui, mas chegou. As pessoas se ignoram por aí. Não se olham, não se sentem e às vezes nem percebem que tem mais alguém nas ruas. Às vezes percebem e olham para o outro lado. Alguns seres humanos parecem merecer sofrer nessa vida em nome de qualquer coisa. Não olhe para os lados e não pise no pé de ninguém, vá direto para casa e não fale com estranhos. Esmola não dá futuro (mas, aquelas pessoas não têm futuro, para elas é tudo muito imediato, é o que vão comer hoje e em que buraco vão dormir).

O ser humano é engraçado, quando escuta o barulho de um carro freando desesperado, espera logo o som da batida; quando não bate é um "ah, nem foi nada". Gosta de ver a desgraça alheia, gosta de contar história de gente desafortunada e dar motivo para tudo dar errado na casa de alguém. Ô, bicho engraçado! De animal não tem nada, mas, se tivesse, acho que seria mais humano.